quarta-feira, 19 de março de 2008

Inconciliáveis

Vocês devem ter lido, ouvido, comentado a defesa apaixonada que o presidente Lula fez ontem do uso de Medidas Provisórias para governar. Se alguém não viu, segue um trecho abaixo:

- Qualquer deputado e qualquer senador sabem que é humanamente impossível você governar se não tiver medida provisória. Porque o tempo e a agilidade com que as coisas precisam acontecer muitas vezes são mais rápidos do que o tempo das discussões democráticas que são necessárias acontecerem no Congresso.

Interessante nessas horas é resgatar o que dizia nos tempos pré-2002 o sumido irmão gêmeo do presidente Lula, o petista Luiz Inácio. Em 10 de fevereiro de 2001, ele assinou o seguinte artigo no jornal Zero Hora:

Usurpação de poderes

Não é difícil imaginar a campanha sem tréguas que a maioria da imprensa brasileira faria contra um governo de esquerda no nosso país se o Executivo legislasse por meio de medidas provisórias. Pois é exatamente isso que faz o presidente FH, passando por cima do Congresso Nacional. Um exemplo gritante: somente nesta semana, após ter sido reeditada 73 vezes, foi votada e transformada em lei a medida provisória que trata das complementações do Plano Real. Aquela, editada lá atrás, há seis anos, em março de 1994, que trata do fim da correção monetária e da proibição de reajustes automáticos de salários.

O presidente FH já editou e reeditou 4,8 mil medidas provisórias nos seus dois governos. É mais um exemplo de como exerce a presidência “esquecendo” o que defendia como sociólogo e parlamentar. Nesta semana, Clóvis Rossi, da Folha de S. Paulo, ocupou uma coluna inteira só com citações do próprio FH, então senador, nas quais critica duramente os governos da época pelo fato de editarem medidas provisórias de modo descabido e abundante. Realmente é para que todos “esqueçam” o que disse e escreveu no passado.

Em meio à guerra que se trava na base governista pelas presidências da Câmara e do Senado, o governo federal está fazendo o possível para evitar que seja votada a proposta de emenda constitucional que limita a edição de medidas provisórias. Por essa proposta, já aprovada pelo Senado em 1999, toda medida provisória perde sua validade se não for votada em um prazo de 60 dias, com direito a uma prorrogação pelo mesmo período de tempo.

Além disso, o governo não poderá mais editar medidas provisórias sobre temas que envolvam orçamento, Direito Penal, nacionalidade ou retenção de qualquerativo financeiro. Muda também o próprio processo de discussão, já que as medidas terão de ser debatidas na Câmara e no Senado separadamente, e as que foremrejeitadas, ou que ultrapassarem o prazo definido para votação, não poderão mais ser reeditadas.

Há outro ponto importante sobre essa questão. Pelo Artigo 246 da Constituição, é proibida a reedição de qualquer medida provisória sobre artigos da própria Constituição cuja redação tenha sido alterada por meio de emenda promulgada a partir de 1995. Isso significa que, se o Congresso aprovasse hoje, por exemplo,uma proposta de emenda constitucional definindo uma reforma tributária, o governo não mais poderia editar medidas provisórias sobre o tema. O presidente FH quer retirar esse artigo da Constituição. E o seu líder no Congresso ainda afirma pela imprensa que se isso não ocorrer o país vai para o caos.

É interessante anotar as atuais disposições políticas do governo para confrontá-las com o quadro político que se avizinha. O presidente FH quer manter as medidas provisórias porque deseja completar o seu modelo econômico, subordinado ao FMI, sem submeter as decisões ao Congresso Nacional. É o que pretende,por exemplo, com as anunciadas alterações no Banco Central e com a regulamentação do sistema financeiro.

Uma espécie de “blindagem da economia” para dificultar as mudanças de rumo do país em um futuro governo das atuais oposições.Isso está sendo tentado pelo governo porque os dirigentes neoliberais estão começando a enfrentar sérias crises em conseqüência das suas políticas antisociais,tanto aqui no Brasil quanto em outras partes do mundo. E essa situação aponta para a necessidade de mudanças políticas profundas, que em parte já começaram a ocorrer em capitais e grandes cidades de muitos países.

Nós temos compromissos de princípio com a democracia e com o fortalecimento e autonomia dos poderes da República. Lutamos contra o arbítrio da ditadura militar e defendemos, tanto ontem quanto hoje, a primazia do Estado de Direito. Penso que há um claro sentimento de saturação na maioria dos partidos, no Congresso, em boa parte da imprensa e nos setores organizados da população em relação a essa forma autoritária de governar por meio de medidas provisórias, levada a extremos pelo presidente FH. É importante para o Brasil que o Congresso dê um basta nesse processo.

1 comentário:

Alexandre Brandão disse...

Luís Inácio falou, Luís Inácio avisou/
São trezentos picaretas com anel de doutor

 
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