Não é fácil explicar quais são as acusações que podem determinar a cassação do governador catarinense Luiz Henrique da Silveira (PMDB) no julgamento da noite de hoje no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Isso não é uma defesa aos argumentos do governador contra a cassação. É apenas a constatação de que estamos longe daqueles casos simples em que basta dizer "foi pego roubando", "comprou voto", etc. Os benditos/malditos "abuso do poder econômico e dos meios de comunicação nas eleições de 2006" talvez precisem de uma retrospectiva...
Um pouco de históriaNa contramão de todos os discursos sobre enxugamento da máquina e afins, Santa Catarina elegeu em 2002 um candidato a governador com uma proposta peculiar. O ex-deputado federal e ex-prefeito de Joinville Luiz Henrique da Silveira (PMDB) propunha a criação de 27 secretarias com sede em diversas regiões do estado. Elas seriam as responsáveis por colocar em prática as políticas planejadas na capital Florianópolis, com a forte atuação de um gestor local, o secretário regional – um homem próximo à população e dos prefeitos da região abrangida pela estrutura.
Com esse discurso, LHS chegou o segundo turno contra o então governador Esperidião Amin (PP), que por pouco não vencera a eleição no primeiro. Na segunda etapa da campanha, LHS conquistou o apoio entusiasmado de Lula e do PT, que chegou a fazer em Florianópolis o último comício de sua campanha pela Presidência. LHS venceu por cerca de 40 mil votos de vantagem.
A chamada "descentralização administrativa" foi colocada em prática nos primeiros meses do mandato. Dois anos depois, LHS ampliou o número de secretarias regionais para 30. A oposição, liderada pelo PP de Esperidião Amin, chamava os cargos de "cabides de emprego" e relacionava a conquista de apoios políticos pelo governador ao número de cargos à disposição para distribuir. Nas eleições de 2006, LHS se reelegeu prometendo "radicalizar a descentralização", com apoio de PSDB e PFL – este último, antigo aliado de Amin.
O início do segundo mandato foi marcado pela criação de mais seis secretarias regionais, elevando para 36 o número total. Elas foram divididas entre PMDB, PSDB e PFL por um critério chamado pelo governador de "geografia das urnas", que levava em consideração o número de parlamentares eleitos pelos partidos para a Assembléia Legislativa – onde LHS tinha apoio de 27 dos 40 deputados. Levantamento feito pelo site G1 colocou SC como líder no número de secretarias entre todos os estados do país, com 48.
A descentralização em questãoO que até então era apenas um projeto de inegável sucesso eleitoral, passou a ser questionado não só pela oposição, mas também pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Em agosto de 2007, o ministro José Delgado pediu a cassação de LHS em seu parecer sobre o processo movido pelo PP por abuso de poder político, econômico e uso indevido dos meios de comunicação social na campanha de 2006. Após pedido de vista de Ari Pargendler, o processo ficou parado por seis meses, mas, em fevereiro de 2008, tanto ele quanto Gerardo Grossi também votaram pela perda de mandato.
Na sessão seguinte, mais um voto seria suficiente para cassar LHS quando o então presidente do TSE, Marco Aurélio Mello, levantou a possibilidade de um erro burocrático na ação. Ele afirmou que o vice, Leonel Pavan (PSDB), deveria ter sido citado. Carlos Ayres Britto argumentou que a jurisprudência do Tribunal nesse tipo de caso dispensava a citação de vices, mas foi voto vencido. Por 4 a 3, o julgamento voltou à estaca zero.
O que chamou atenção dos ministros do TSE e quase levou à cassação do governador catarinense em fevereiro de 2008 não foi a criação de cargos e estruturas, mas o esforço feito para divulgar os benefícios do novo modelo administrativo. Integravam o processo campanhas institucionais de televisão, rádio e jornal veiculadas entre 2004 e 2005, duramente criticadas pelo ministro Pargendler. "Há prova farta nos autos que a publicidade institucional o governo do Estado de Santa Catarina favoreceu a candidatura de Luiz Henrique da Silveira mediante promoção de seus feitos enquanto governador daquele estado", afirmou o magistrado no parecer em que pediu a cassação.
É isso que volta à pauta do TSE na noite de hoje.